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"Paisagismo não pode ser considerado artigo de luxo", afirma Ananda Apple.


Fazendo uma "viagem de volta ao tempo”, fale um pouco sobre você e início de sua carreira no jornalismo.

Ananda_Apple_13  Sou de Porto Alegre e eu acredito que eu sou uma das poucas pessoas que desde os quatros anos de idade, já sabia o que eu queria ser na vida. Naquela época eu já dizia: eu quero ser atriz de cinema e escritora! De certa forma, daquela minha inocência de quatro anos, para o que eu sou hoje, é isso que eu me tornei. Não atriz de cinema, mas alguém que aparece na televisão, que usa o rosto, o corpo, para contar uma história, uma observadora da história que escreve e que conta sobre isso. Eu me tornei aquilo que eu queria ser com quatro anos. Tem outro nome, não era bem o que eu imaginava, mas eu queria alguma coisa que aparecesse na tela e que eu contasse uma história, que eu fosse à escritora. Não é o que aconteceu comigo? Só entendi que isso era jornalismo lá pelos quatorze anos. Com essa idade eu já dizia que seria jornalista, desde que meu trabalho estivesse envolvido com música, porque como toda adolescente, o mundo da música e dos Beatles, me fascinava. Então eu passei a dizer que eu queria ser jornalista para escrever sobre música, para trabalhar em rádio.

  Aos trezes anos eu já escutava muito a rádio Continental, em Porto Alegre, que era a rádio dos jovens (AM 1120’’). Aquele mundo me fascinava e eu comecei a ir aos shows que a rádio promovia. Eu desenhava esses shows, os artistas representando e eu ia escrevendo o que eles falavam, o que eles cantavam, as piadinhas. Quer dizer, eu estava fazendo uma reportagem. Um dia eu cheguei aos técnicos lá da rádio durante esses shows que eles faziam, que chamava-se “Vivendo a vida de Lee”, que foi uma revolução na música do Sul, que começou a mostrar músicos gaúchos jovens, não mais os tradicionalistas, mas os urbanos. Cheguei e disse: olha eu faço isso aqui sobre os shows de vocês [mostrava os desenhos e o que escrevia]. Aí os caras disseram: vai a rádio e mostra isso. Comecei a trabalhar de graça, arrumando os arquivos da rádio, desde jornal, as coisas sobre aquele movimento musical. Com o tempo comecei a arrumar a discoteca. Imagina se eu não gostava! Com treze anos, eu estava trabalhando junto com os meus ídolos do rádio, os locutores, os comunicadores da época. Eu via os músicos chegando e tinha a oportunidade de conversar com eles e comecei paralelamente a isso, a pesquisar muito sobre os Beatles. Entendia muito sobre esse assunto. Com quatorze anos eu tinha escrito quatro volumes da biografia deles, com pouquíssimo de informação que chegava no Sul. Eu pesquisava por tudo e escrevia sobre a história deles. O pessoal da rádio acabou me chamando para fazer um programa sobre os Beatles. Na época era a rádio “Gaúcha FM”, que pertence a RBS, retransmissora da Globo. Com 17 anos eu passei a ter um programa semanal sobre os Beatles. Fui passando de rádio em rádio, sempre dentro do grupo RBS, tendo esse meu programa próprio, até o dia em que surgiu uma vaga no jornalismo e um grande amigo disse: porque tu não vai lá e faz um teste? Pensei: imagina, eu não entendo nada disso, sou apenas uma pessoa que fala sobre música. Ele insistiu e eu acabei indo. Deu certo. Isso foi em 1984, o ano em que eu passei a fazer reportagens na TV. Comecei a fazer as matérias a noite, sobre shows e fazia bem feito. Outros repórteres achavam castigo ter que trabalhar a noite. Imagina se eu não gostava de ficar cobrindo shows? Era algo que eu sabia fazer, por isso, fazia bem feito. Em seguida, passei a apresentar um programa de música na TV, que ia ao ar ao meio dia, o que seria um precursor desses VJs de hoje, da MTV. Depois eles me passaram para o período da manhã, para fazer o factual, o dia a dia e foi assim que eu comecei no jornalismo, pela porta da música.

Para ter um jardim bonito e florido é preciso ter informação. Além do “Quadro Verde”, que vai ao ar toda sexta-feira no jornal “Bom Dia SP”, pela TV Globo, em sua opinião quais sãos os outros meios de comunicação em que as pessoas podem se informar?

  Eu amo a revista Natureza, onde trabalham profissionais muito sérios. Conheço pessoalmente à Aida e o Valério (fotógrafo). Eles amam o que fazem e eu adoro as matérias deles. Eu acho que essa revista sempre foi muito séria. Eu tenho toda a coleção e aprendi muito com essa publicação e sempre comprei os livros deles. Quando eu estou diante de um paisagista eu pergunto tudo o que eu não sei, nem que eu pergunte novamente, eu não tenho vergonha. A minha professora de português já dizia: “burro é quem não pergunta”. Perguntar não é burrice, ficar quieto fazendo de conta que sabe tudo é. Atualmente é muito fácil obter informações através da internet, tem muito conteúdo interessante sobre o setor, nos quais eu aprendo também.

Além da sua admiração pela música, você também admite ser apaixonada pelas plantas. Quais são as suas espécies favoritas?

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   Ananda mostra a orquídea chuva de ouro, uma de suas espécies favoritas

           Em termos de árvore, eu tenho o maior respeito pela Sibipiruna, que é fantástica. A Tipuana, o Jacarandá Mimoso, que está florescendo agora, é a árvore que cobre Porto Alegre e que me trás as melhores lembranças. Além disso, tenho respeito comovido diante do Pau Ferro, que é aquela árvore com tronco malhado de branco, muito detonado pelas cidades. Eu acho lindo o Pau Ferro, assim como a Paineira. Não gosto muito desses Coqueiros, dessas Palmeiras, que têm essa “cara de Miami”. Gosto muito das árvores frondosas e de grande porte, que abrigam ninhos para os pássaros. na parte das flores, o que eu mais gosto são as orquídeas, pela variedade. Acho o máximo também às mini e micro orquídeas, dessas que você não compra em lugar algum, que eu ganho em exposições ou dos meus amigos orquidófilos. Muitas delas, você precisa de uma lupa para enxergar, a orquídea negra, a Miltônia, que um produtor (Sr. Nagase) fez em homenagem ao meu nome e o nome das minhas filhas. Achei muito bonita, porque ela parece o amor perfeito. Se cuidar bem, elas serão eternas.  

Quais são as condições básicas para o cultivo de flores e plantas, seja em casa ou apartamento?

  Condição número zero e que quase ninguém atende: ter tempo para elas. As pessoas querem comprar plantas, espalhar pelos locais da casa e achar que “Deus vai cuidar”. Muitos se esquecem que o vento desidrata, se a sua planta está em um vaso, ela está engaiolada, como se fosse um pássaro, por isso, precisa de cuidados. Foi você que comprou, você que a colocou ali e se quiser que ela floresça, tem que cuidar. Vale ressaltar que a pessoa também precisa saber se a planta precisa mais de Sol ou de sombra, se venta muito no local. Tempo, cuidado e informação, é disso que as plantas precisam. Infelizmente a maior parte das pessoas não faz isso. Planta é como se fosse um filho!

Cite algumas espécies de plantas que são ideais para as áreas internas e externas?

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                                    "Em casa costumo ter apenas aquilo que dá menos trabalho, que                                    possa dar mudas e que fique durante muitos anos comigo"

  Vou exemplificar com aquilo que eu tenho em casa. Há cada dez ou quinze dias, eu compro plantas e vou trocando, não tem outro jeito. Eu costumo comprar a kalanchoe, a violeta, crisântemo daqueles bem fechadinhos. Toda planta dentro de casa, de uma forma geral vai degringolando com o tempo. É muito difícil ela chegar ao seu apogeu. Já na varanda, ao longo dos anos eu fui fechando o leque. Atualmente eu tenho praticamente apenas bromélias e orquídeas, porque os tratos não precisam ser diários e porque elas me dão filhos. Todas essas que estão aqui são “muda da muda, da muda, da muda” que eu já refiz. Eu também sempre faço a poda correta das minhas plantas e quando preciso desfazer de alguma, nunca eu jogo no lixo, sempre presenteio alguma pessoa, ou as empregadas levam, os funcionários daqui do prédio também levam. Em casa costumo ter apenas aquilo que dá menos trabalho, que possa dar mudas e que fique durante muitos anos comigo. Quando elas estão bonitas lá fora, eu levo para dentro de casa.

Com relação às pragas, quais são os cuidados a serem tomados e com que freqüência?

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A Cochonilha (a esquerda) e o Pulgão (a direita) são as pragas mais comuns dentro de casa

  A praga mais comum dentro de casa é cochonilha e pulgão. As pessoas precisam observar as suas plantas o tempo todo. Já utilizei muito aquela mistura de fumo que fica na água, que é ótima para pulgão. Em geral, quando eu vejo pragas numa orquídea, por exemplo, eu a coloco debaixo da torneira com esponja, escovinha de dente com sabão de coco e tiro tudo mecanicamente [Ananda confessa que aprendeu isso com sua tia]. É importante sempre inspecionar e retirar essas possíveis pragas ainda no início.

De  que forma o paisagismo pode contribuir na qualidade de vida das pessoas?

Ananda_Apple_16  Em qualquer lugar do Brasil e em São Paulo, especificamente, as pessoas são muito sequiosas do verde.  Todo mundo quer ter verde, porque verde traz alegria, vida, paz e as pessoas anseiam por isso. Planta em SP, todo mundo quer ter, desde a pessoa mais humilde até o mais rico. Existe uma visão errônea do paisagismo, seja residencial ou urbano. As pessoas acham que sabem fazer tudo sozinhas, que paisagismo basta saber podar e aí fazem aquelas coisas erradas que acabam saindo mais caro. Eu acho a profissão fantástica! O paisagista é o melhor profissional para fazer você economizar e tratar bem das plantas e o espaço em que elas irão viver. O paisagista não é um gasto de luxo, ele vai fazer você economizar. Paisagismo não é artigo de luxo, é que nem arquiteto, para fazer uma casa direito, você vai economizar mais com o trabalho desse profissional. Os paisagistas conhecem o conceito e as possibilidades que a maior parte das pessoas desconhece. O estado de SP é o maior produtor de plantas e flores do país, têm os melhores profissionais e por conta de uma ordem política e da ignorância de alguns dos nossos governantes, em todos os níveis, isto não é aproveitado. São Paulo é uma calamidade nesse aspecto. Não tem um governante que se importa com isso, de forma efetiva. Com essa riqueza que nós temos de espécies, que é a maior do mundo e com a produção que nós temos nesta cidade, neste Estado, deveria ser fantástica em termos de paisagismo, com mais jardins espalhados, grandes árvores resolvidas. Deveríamos pegar grandes áreas, plantar grandes árvores frutíferas para atrair fauna. Eu diria que no mínimo 99% da cidade de São Paulo têm árvores erradas, plantadas nos lugares errados e tratadas do jeito errado. O paisagismo da cidade está completamente errado. Isso é uma culpa política, não é falta de talento e nem falta de material.

Qual a sua dica para as pessoas que pretendem contratar um paisagista?

Ananda_Apple_23  É importante obter o máximo de informações sobre o profissional. Indicação é sempre muito bom, além de acessar os sites deles também. Outra questão essencial é saber o quanto a pessoa pretende investir. Existem os profissionais que são estelares e que fazem obras para revista e com o passar do tempo, aquilo degringola. Na foto o projeto fica esplendoroso. Têm os estelares que pensam de outra forma, que sempre dizem que fazem jardim para ter história. No primeiro ou no segundo mês, o jardim não vai estar tão bonito, porém, passa na estação seguinte para ver como ele vai estar. Esse é o meu estilo e é disso que eu gosto. O jardim que veio para ficar, que quanto mais passa o tempo, mais ele vai se tornando dono do espaço, inteiro, sem estar todo podadinho é o que eu mais gosto, desses mais naturais. Existe paisagismo para tudo quanto é bolso. Você pode chegar para o profissional e dizer que gosta de tais espécies e objetos e que tem determinada verba para o investimento. Ele vai fazer, pois ele é profissional e vai se adaptar ao seu gosto. É uma profissão interessante, você tem para onde ir, dentro do seu bolso e da sua necessidade.

"Acredito que deveria existir mais entrosamento entre o paisagista e o arquiteto na hora de fazer qualquer construção na cidade. Todos os aspectos inerentes ao projeto de paisagismo dos empreendimentos deveriam ser pensados desde o início da obra"

No Brasil ainda não existe o curso para a formação acadêmica de um paisagista. Em sua opinião, quando essa situação mudar, esse profissional deverá ser mais valorizado?

  Os nossos paisagistas são formados na raça. Em sua maioria no autodidatismo. Eu acho que a criação de um curso acadêmico poderia ser uma ótima saída sim, desde que esses profissionais que se formaram na raça sejam os professores dessas pessoas que pretendem ingressar na área. O paisagista virou meio que um conceito glamouroso, numa espécie de chefe de cozinha. É preciso ter muito cuidado com isso e separar o joio do trigo. Atualmente, nós temos paisagistas de todos os tipos. Tem os estelares, que não é a minha praia, mas eles têm os nichos deles, o que não quer dizer que esses estelares não façam um bom trabalho. Tem o nível que faz a diferença, tem o nível mais humilde, que atende as pessoas que têm menos dinheiro e vai resolver os problemas delas. Eu acho essa profissão muito importante, apesar de ser negligenciada e mal compreendida. Acredito também que deveria existir mais entrosamento entre o paisagista e o arquiteto na hora de fazer qualquer construção na cidade. Todos os aspectos inerentes ao projeto de paisagismo dos empreendimentos deveriam ser pensados desde o início da obra.

Qual a sua opinião sobre os eventos ligados ao paisagismo que são feitos aqui no Brasil? (Fiaflora, Expoflora, Enflor e Garden Fair, Casa Cor, entre outros)

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                Stande do Paisagismo em Foco presente na Fiaflora Expogarden 2011, a maior feira de                paisagismo e jardinagem da América Latina, que recebeu mais de 31 mil visitantes este ano

  Acho que esses eventos são fantásticos. É a oportunidade das pessoas saberem sobre o que está acontecendo, as novidades e lançamentos.  Esses eventos são importantes para as pessoas que gostam de plantas e para quem vive desse setor, para os produtores que estão lá para mostrar os seus produtos. Acredito que em nosso país, com a nossa atual produção, deveria ter mais feiras, inclusive no nível micro, como já existiu. Quem não se recorda do evento que ocorria na marquise do Ibirapuera, anualmente, no mês de setembro? Durante 15 dias, a marquise inteira era tomada por pequenos produtores da região. As pessoas se enchiam de plantas e elas adoravam isso. O Pitta (ex-prefeito de SP) acabou com essa “mini feira”. Eu acho que este tipo de evento deveria ocorrer durante todos os finais de semana, em todos os parques, com pessoas vendendo plantas. Nós temos poucos lugares em SP. Posso citar a Ceagesp, que é apenas para quem pode ir de terça e sexta, de manhã, já que os dias e horários são restritos. Falta muito lugar para vender plantas aqui no Brasil. Isso porque estou falando de São Paulo. Imagina a situação em outros lugares? Em Porto Alegre, por exemplo, eu nem sei onde posso comprar plantas direito. Existe a Cobal, que seria o Ceagesp de lá, mas o local deixa a desejar. Muitas floriculturas não têm criatividade e tem gente que produz um trabalho muito legal. Tudo é uma questão de aprendizagem, as pessoas precisam aprender com profissionais como à Ana Rita e o Ralph (colunistas aqui da nossa revista eletrônica e responsáveis pela Floral Design), como é que se faz para ter uma floricultura sem ser brega, uma floricultura para todos os bolsos, que seja ao mesmo tempo criativa e diferente. Hoje em dia é possível comprar flores e plantas pela internet, porém, elas ainda agregam muito valor. É um vaso disso, um chocolate daquilo. Não dá! Quem é que pode comprar aquilo? É um serviço fantástico, bonito e muito bem feito, além de prático, mas ainda assim, muito caro. Infelizmente é para poucos.

Você acredita que as plantas podem captar a energia humana? Por quê?

Ananda_Apple_9  Totalmente e já vi isso. Como todo ser vivo, ela capta energia negativa e positiva. Algo positivo que aconteceu na minha vida: quando eu tinha quinze anos eu dei uma violeta de presente para a minha mãe, no Dia das Mães. Quando eu completei 21 anos, a violeta continuava lá, muito maior e com muitas flores. Era uma violeta comum e depois de muitos anos, ela estava enorme e toda florida. Um dia minha mãe viajou para Israel e disse que não iria ver a violeta florida – que estavam com os botões enormes e prontos para abrir. Eu registrei a frase e ponto. Passado mais de vinte dias, minha mãe voltou e no dia que ela chegou, todos os botões abriram-se. Ninguém vai me dizer que aquilo foi coincidência. Eu tenho certeza que a planta, não sentindo a minha mãe, a energia, a voz, o cheiro, as ondas magnéticas, sem a minha mãe lá, para quem ela iria abrir? No dia que a minha mãe retornou da viagem, as flores da violeta abriram-se. Acredito que ela captou a volta da minha mãe, que gostava muito dela. Essa violeta ficou viva por mais de 20 anos. Eu tinha um medo secreto de que quando essa violeta morresse, seria o tempo em que a minha mãe morreria também. Eu perdi a minha mãe há dois anos, mas essa violeta foi embora antes e tinha uma relação muito estreita com a minha mãe. Já um exemplo da energia negativa, que posso citar, é na época do meu primeiro casamento. O meu apartamento não tinha varanda, só uma janela com um para-peito bem fininho e mesmo assim eu já tinha muita planta. Naquela época estava em separação e em um período extremamente triste, mas mesmo assim continuava regando as plantas e percebi que elas foram decaindo, decaindo, decaindo, murchando e não revigorava. Pensei, olhei, procurei alguma doença ou praga e nada. Até que chegou o momento que eu percebi que aquilo estava acontecendo devido a minha energia. Eu as regava com a mesma água, mas com uma tristeza profunda e sem dúvida elas captaram e foram morrendo todas. Eu não tenho religião, mas eu acredito na energia boa e má dos seres humanos. Essa energia é palpável e real, cansamos de ver exemplos assim. As plantas, da mesma forma sentem isso.

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Esta belíssima orquídea, conhecida popularmente como chuva de ouro, foi plantada pela jornalista

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A jornalista adora cuidar pessoalmente das plantas da área de lazer do prédio onde mora

Em sua opinião, a indústria e o mercado estão de fato preocupados com as questões da sustentabilidade?

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Ananda Apple e o ambientalista Ricardo Cardim, responsável pela Envec Telhados Verdes

   Eu acho que em sua maior parte ainda é marketing. Essa questão deveria ser levada a sério há no mínimo uns vinte anos atrás. Agora que estão começando a falar e é tudo muito tênue e tudo muito pouquinho em termos de diferença para o planeta. Posso citar o ambientalista Ricardo Cardim, que tem uma empresa de telhados verdes. Ele sem dúvida é apaixonado pelo que faz e o que ele faz, por exemplo, faz a diferença. As pessoas deveriam conhecer mais e pagar por isso. Outro exemplo que posso citar é o Marcos Vitorino, da faculdade Cantareira, que inventou de fazer hortas em cima do telhado, pegou o telhado da faculdade, que tinha apenas cimento, criou de hortas e começou a fazer isso em escolas. Isso são atitudes de fato realistas, factível no sentido do que é possível ser feito e não inventar algo mirabolante, que no fim das contas acaba sempre no papel. Fiz uma reportagem em Indianópolis, em um prédio de uma empresa de grande porte e ali eu observei que de fato eles criam peixes em aquários gigantes, eles têm horta, eles têm jardim, utilizam o mínimo de energia elétrica, além de reaproveitar e captar a água da chuva. Isso é ser ecológico, de fato. Isso faz a diferença. Infelizmente ainda existe muita “maquiagem” nesse sentido e pouco retorno para o planeta. Outra questão que me deixa intrigada é quando eu vejo em revistas ou exposições, chamadas que falam sobre as “casas ecológicas”. Só que essa casa tem madeira e outros itens que foram extraídos da natureza. Chamam de ecológica porque têm materiais naturais lá dentro, porém, para o material estar lá, com certeza muito local foi depredado. Quer dizer, essa casa seria ecológica se ela fosse feita de PVC, de pneu, aí sim ela está tirando restos e lixo do ambiente, sem degradar áreas ou comprar materiais novos para construir uma casa. Mesmo que dizem que a madeira é certificada e de reflorestamento, a árvore foi retirada de algum lugar. Ainda não temos tecnologia para aproveitar o material que está no lixo e que é nobre, como o plástico e outros itens. O Brasil é campeão de geração de resíduos e de não reciclar nada. São Paulo recicla menos de 1% de todo o seu lixo. Eu me sinto uma palhaça. É vergonhoso o que nós produzimos de lixo e o que nós não reciclamos. Esse percentual é um atestado de incompetência absoluta dos nossos governantes.

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                                                 A horta idealizada no telhado da faculdade Cantareira,                                               localizada em SP, foi desenvolvida pelo autodidata Marcos Vitorino

Fale sobre a sua viagem para a Europa em comemoração aos 13 anos do “Quadro Verde” e que você aprendeu durante as reportagens?

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A jornalista conhece o mercado de flores de Amsterdã, na Holanda

Ananda_Apple_na_Holanda_Parque_Keukenhof_I  Basicamente o que eu aprendi lá é que o jardim para eles não é algo para rico. É condição salutar de lazer e de congregação familiar, como se fosse um cômodo da casa. Eles podem até não ter nessas cidades do interior da Holanda, um jardim para exibição na frente da casa, pois o jardim em geral é atrás. Na frente das casas eles costumam ter as macieiras e algumas plantas que só eles têm e que eu achei fantástico, já que eu desconhecia a maioria delas. Eu conheci um casal de aposentados que gasta quase todo o salário deles em gardens centers, no período da troca da estação. Eles querem deixar tudo aquilo lindo, porque quando acaba o inverno, eles querem ficar lá fora, é o cômodo mais especial da casa, por isso, fica localizado nos fundos, preservando a intimidade da família. Na Europa todo mundo tem jardim, vasos na janela. Gardens Center para eles é como o supermercado para nós aqui, não é algo para rico ou mesmo para poucos. Lá, ter jardim faz bem, é uma espécie de terapia. Achei tudo encantador. Aqui no Brasil alguns paisagistas costumam envelhecer as coisas para dar um aspecto antigo, lá elas já são envelhecidas, porque vieram do avô, da avó...

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                            A jornalista visita o Parque Keukenhof (ambas imagens), o maior jardim                              florido do mundo, que fica na cidade de Lisse, próximo à Amsterdam

Você pensa em escrever um livro?

  Sempre me cobram esta questão, principalmente no sentido de ensinar as pessoas. Eu sei que falta muito livro e informação aqui no Brasil. Quem vai a uma livraria onde têm livros importados, fica “louco” com as maravilhas do acervo bibliográfico estrangeiro. Aqui nós ainda temos poucas publicações, sem contar que muitos ainda são de nível técnico. Eu sei que eu devo isso às pessoas, eu sei que eu falo de um jeito fácil para elas entenderem. Na televisão eu faço isso, porque eu quero que todo mundo me entenda. Eu fico muito honrada quando um paisagista como o Benedito Abbud ou algum outro afirma que aprendeu algo comigo. Eu sinto que eu devo isso as pessoas, porém, com o atual ritmo que eu levo a minha vida, mãe solteira, com duas filhas de nove anos e com o meu trabalho, eu ainda não consigo parar para fazer isso. Em algum momento eu espero poder ter tempo para me dedicar ao livro.

Uma planta?

  Orquídea

Uma flor?

  Hortência

Uma árvore?

   Pau Ferro

Um cheiro?

  Mato depois da chuva

Um livro?

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  Não tenho um livro definitivo, sempre o que eu estou lendo acaba sendo o mais interessante. Um livro que eu me envolvi muito foi o “John” da Cynthia Lennon, que fala sobre o John Lennon. Achei esta publicação devastadora, ainda mais para uma pessoa que gosta dos Beatles. É um livro que me fez sofrer muito e rever muitas versões que eu tinha do lado do John e da Yoko. 

 


Maior sonho?

   É um sonho bem universal. Gostaria que as pessoas respeitassem a Terra, de verdade e que isso não fosse apenas um discurso. Afinal de contas é a Terra que nos oferece tudo, não é mesmo? Comida, bebida, ar e é a única coisa que pode manter as pessoas vivas e a maior parte das pessoas não a respeita. Meu maior sonho é esse, que o mundo continue. Isso depende de nós, seres humanos.

Uma frase?

  A vida é aquilo que te acontece, enquanto você está ocupado, fazendo outros planos para ela”, por John Lennon. Acredito que todo mundo deve ter um planejamento de sua vida. Eu, por exemplo, sou muito rotineira, gosto de ter segurança, eu gosto de pensar o que vai ser o ano seguinte, o que eu vou fazer, porque faz parte do meu caráter responsável. Mas na verdade, muitas vezes você planeja, traça um caminho e a vida vai acontecendo à revelia dos teus planos e o seu caminho acaba virando outro. A vida se impõe. Enquanto você pensa que está dominando e fazendo tudo, a vida já está acontecendo e de outro jeito. Quando eu era mais nova, pensava assim: “no dia que eu tiver”, “no dia que eu for tal coisa, eu vou ser feliz”. As pessoas cometem muito pecado ao dizer: “quando eu tinha tal coisa”, “quando eu era tal coisa, eu era feliz”. Elas dificilmente estão felizes no tempo presente. Eu tento ao máximo reconhecer que agora eu estou feliz, que isso é felicidade. Eu tenho saúde, eu tenho dignidade, eu tenho trabalho, eu tenho duas filhas saudáveis e estou fazendo o melhor que eu posso. Quando eu saio com elas, aos finais de semana, eu pego nas mãos delas e nós vamos caminhando, às vezes na praia, eu sempre dizia: Céo e Liz, isso que está acontecendo agora é felicidade. Não esqueçam, estamos sendo felizes agora, andando de mão dada, em um lugar lindo, com quem nós amamos e está tudo bem. Felicidade é isso. A chave da vida e que eu tento passar para elas consiste em saber reconhecer o agora o que está bom. Não quando era bom ou o dia que for, porque esse dia nunca vai chegar e atrás já era. Ou você reconhece agora, ou você não tem vida. Felicidade às vezes é quando eu deito no sofá, com um chocolate que eu gosto e assisto “House”. Ir à noite ao quarto das minhas filhas, olhar para elas e ouvir: mamãe, o beijo, o bicho, o convercê. O beijo é quando eu entro no quarto e dou beijo. O bicho é quando eu pego um bicho e atiro-o de uma determinada altura. Já o convercê é ficar esfregando o nariz e apertando elas. Acho o máximo e adoro ouvir quando uma de minhas filhas chama a outra de “mana”. Isso é felicidade, nesse aspecto ela é simples e de graça. Só aprendemos vivendo. Outro momento de felicidade é quando eu estou de folga e vou almoçar em um restaurante bem gostoso, lendo uma revista que eu adoro. Depois vou e escolho um filme bem bacana. Vejo e curto aquele filme, às vezes ele acaba e tenho vontade de aplaudir e falar para as pessoas ao redor o quanto ele é maravilhoso. Felicidade é tudo muito simples.

Pergunta dos leitores

  Anunciamos em nossa página no Facebook, que iríamos entrevistar a jornalista Ananda Apple. Alguns leitores enviaram as suas perguntas. Confira:

Qual a reportagem mais importante realizada durante todos estes anos de carreia? (Márcio Pottratz - Técnico - Gramado / RS)

   Eu não diria que tem a mais importante. Eu tive muitos momentos importantes da história do Brasil. Fiz a cobertura de desastres aéreos, estive nos grandes enterros, no Plano Cruzado, entre outras reportagens, tudo isso cobri como tantos outros repórteres. Mas nada me comove tanto e me faz tanto mal quanto ver criança sofrendo, por exemplo, em incêndios, desocupação de favelas. Quando eu não trabalhava com jornalismo e que eu via que acontecia uma tragédia e o repórter terminava sempre dizendo que a “prefeitura afirmou que vai tomar as devidas providências”, eu ficava aliviada. Fazendo reportagem eu aprendi que não é nada disso. Diante da grande tragédia, o que mais acontece é que em geral tudo fica muito mal. Ao ver a inoperância dos órgãos responsáveis, eu sei que as famílias irão continuar no meio da rua, que as crianças deverão passar fome, que elas não terão roupa. É até baixo astral dizer isso, mas é a realidade. Não tenho a melhor reportagem ou a que mais me marcou. Depois que eu tive as minhas filhas, essa dor de presenciar esses fatos é ainda maior, eu não consigo às vezes nem dormir. É muito difícil você ser feliz ao estar cercado de tanta gente que está infeliz.  

Qual reportagem na área de Paisagismo que você gostaria de fazer e ainda não fez? (Rosmari Lazarini - São Caetano do Sul / SP)

   A que eu quero fazer no ano que vem. Pretendo voltar para a Holanda e fazer a Floriade, conhecida como a maior feira de plantas do planeta e que acontece somente a cada dez anos. Esse mega evento acontece em 2012, justamente um ano depois de ter ido lá. Essa é a reportagem que eu quero muito fazer. [Nesta hora Ananda confessa que tem fobia de avião e afirma que nada garante que aeronave não vai cair enquanto ela estiver lá. Ela admitiu também que foi um enorme sacrifico ter de ir para a Europa de avião].

Que relevância o governo federal e estadual dá a arquitetura paisagística tendo em vista a Copa do mundo de 2014? Estamos no caminho certo? (Pacifico Junior – Paisagista – Brasília / DF)

   Claro que não. Nada está sendo feito, nem estádio, como vai se pensar em paisagismo?

Porque as prefeituras não plantam só árvores frutíferas nas praças e ruas? (Iraciara da Costa - Ceramista - Campinas / SP)

   Se eu não me engano, existe uma lei municipal que afirma que não pode plantar árvore frutífera em calçada. É claro que deveria ter frutífera em tudo que é lugar, nas margens dos rios, nas calçadas, com o intuito de atrair os pássaros, que irão disseminar mais árvores. Seria um ganho ecológico que as cidades teriam.

Adoro as reportagens da Ananda, porém, tem uma que não esqueço, quando ela comentou que sua filha tinha comido algumas plantinhas dela. Achei muito engraçado, porém, não são apenas as crianças que podem comê-las, mas os animais também. Quais são os cuidados a serem tomados? (Monica Amato)

   (Risos) Isso aí aconteceu quando elas tinham sete meses. Eu ganhei uma Miltônia do Sr. Nagase, quando ainda não tinha o nome delas e eu deixei ela no chão da varanda e a minha filha ainda engatinhava e estava na sala e depois foi para a varanda. Precisei sair de lá e quando eu voltei à orquídea estava sem flor, ela estava com aquela mãozinha de criança comendo a flor e colocando-a na boca (risos). É preciso conhecer as plantas que você vai colocar em sua casa, pois o risco é iminente. Tudo é uma questão de conhecimento. [Ananda é mãe de gêmeas, uma se chama Céo, em homenagem à sua tia, que ama as plantas. A outra filha chama-se Liz. As plantas então: Miltônia Céo Apple e Miltônia Liz Apple].

Siga o perfil oficial da jornalista no twitter @anandaapplereal

Imagens: reportagem Paisagismo em Foco / Arquivo pessoal