“Minha meta é revestir todas as cidades com plantas”, afirma a paisagista Gica Mesiara
Há mais de 30 anos, Luc Schuiten cria as chamadas “cidades vegetais”
“Meu trabalho busca o momento de síntese em que a natureza e o trabalho do homem se reconciliam”, diz Schuiten. A frase de Luc, que extrai da reportagem da revista da Folha, é muito semelhante ao propósito que Gica deixou claro, durante o nosso encontro, que aconteceu num casarão avaliado em 19 milhões de reais no evento Hyundai Mostra Black, em SP. Nossa conversa aconteceu no espaço que contemplava o jardim vertical criado por ela, através de sua empresa, chamada Quadro Vivo. Por falar em jardim vertical, a empresa de Gica, aplica técnicas próprias patenteadas universalmente, permitindo a instalação de verdadeiras obras de arte, tanto para ambientes internos quanto os externos. Segundo ela, sua empresa uniu design, funcionalidade e tecnologia, criando dois tipos de jardins verticais: o Quadro Vivo e o Painel Vivo. Os dois tem em comum a facilidade na manutenção, graças a um moderno e exclusivo sistema de plantio por encaixe ao sistema computadorizado de regas, que garantem a saúde e a beleza das plantas e a comodidade do cliente.
Desenho do visionário Luc Schuiten
De volta no tempo
Gica relembra a sua trajetória e fala sobre sua evolução pessoal e profissional
A história da paulistana Gica Mesiara é bastante peculiar, como tantas outras, porém, com uma “pitada de verde”. Nascida em um bairro humilde de São Paulo, ela afirma que sempre foi uma criança apaixonada pela natureza. “Amo o planeta Terra, amo esse planeta azul, que se depender de mim, ficará cada vez mais verde. Sempre tive essa conexão com a natureza, com a flora, com as plantas, com os animais.
Gica recebe a reportagem em seus jardins verticais, presentes na Mostra Black
A paisagista afirma que sempre quis trabalhar com a natureza de alguma forma. “Queria ter feito faculdade de agronomia, cheguei a prestar o vestibular e a passar, mas não pude ingressar no curso por uma questão financeira, já que na época minha família não tinha condições. Eu parei para refletir e cheguei à conclusão: precisava de dinheiro!
Se ele por um lado me atrapalhava na realização dos meus sonhos, por outro, ele seria fundamental. Como eu precisava ganhar dinheiro e um lugar que teria muito dinheiro seria um banco (risos). Fui parar em um banco por uma questão muito prática. Aos 17 anos, comecei a trabalhar em uma agência, aos 18 anos passei a ser gerente, inclusive, a gerente mais jovem do mercado financeiro, na época. Fiz carreira e ao longo de 11 anos, fiz especialização na área de investimentos. Trabalhei nos maiores bancos do país e sempre cuidando de grandes contas, de grandes investidores.
Aos 25 anos, fui fazer uma viagem para a Bahia e dentro de uma meditação eu percebi que estava na hora de encarar o meu propósito: porque eu vim para este planeta? Foi a partir deste momento que eu quis reestabelecer o contato dos seres humanos com a mãe natureza, através das plantas. Eu decidi dedicar minha vida, o meu tempo e a minha energia a isso.
Engajada nesse propósito passei a utilizar o meu intelecto no desenvolvimento de tecnologias, que pudessem fazer com que o ser humano viesse a ter uma reconexão com o verde e com a mãe natureza. Esse é o meu objetivo de vida. Tenho 38 patentes de soluções, e nem todas foram lançadas ainda. Algumas, o público já conhece e utiliza, que são os jardins verticais e existem outras que ainda não estão disponíveis no mercado. Todas elas voltadas com o objetivo de reaproximar o homem junto à natureza. E todas elas dentro de um conceito de tecnologia, com o mínimo de impacto ambiental e o máximo de beleza estética. Tudo o que eu faço, está baseado nesses três tripés. Então é o tripé da tecnologia, ou seja, algo que seja fácil, moderno, com tecnologia de ponta e com menos trabalho possível, porque o homem moderno demanda a otimização do tempo, que é a nossa maior riqueza. Devemos estar em contato com a natureza, mas não temos muito tempo para dispender com isso.
O tripé da tecnologia nos ajuda a sempre desenvolver e resolver inúmeras questões. O outro tripé, fica por conta do mínimo impacto ambiental, que a meu ver é muito importante. Todos os produtos que forem desenvolvidos pela marca Quadro Vivo, sempre terão como premissa, o mínimo impacto ambiental. Utilizamos materiais em nossos produtos, com qualidade e durabilidade, que é uma atitude ecológica e que venham a causar o mínimo de impacto na natureza.
Os quadros vivos, por exemplo, contam com molduras produzidas com materiais ecológicos, ou de madeira de reflorestamento, ou de acrílico reciclado. Sem abrir mão da segurança e da beleza, ainda sim buscamos oferecer os melhores produtos com os materiais menos impactantes. É muito importante que o meu trabalho agrade o olhar do interlocutor. Podemos não entender muito de arte, muito de estética, mas entendemos quando olhamos para algo que nos agrade ou não.
Os meus trabalhos e os da Quadro Vivo, de maneira geral, são focados na estética, porque nós buscamos atrair o olhar do público para a natureza, isso tem um motivo poético e prático ao mesmo tempo. Entendemos que o belo atrai olhares e que a natureza precisa ser contemplada, por isso, a estética acaba sendo uma marca registrada dos nossos trabalhos, é uma perfeição. Muitos de nossos clientes, que são grandes profissionais do paisagismo e utilizam a nossa técnica, afirmam que o nosso trabalho é uma obra de arte, primoroso, rico em estética, tecnicamente bem resolvido, porque nos baseamos nessas três premissas: tecnologia, beleza e o mínimo impacto ambiental".
A seguir, a síntese da entrevista.
Quadro Vivo Painel Vivo
- Já ouvi falar que você atua em no máximo três projetos anuais de jardim horizontal. Essa informação é verdadeira?
Desde quando eu iniciei a minha carreira de paisagista há 12 anos, eu já desenvolvia os projetos do jardim vertical. Foram 7 anos aprimorando, melhorando, até que em 2007, eu abri a venda na Casa Cor e foi quando eu também decidi expor o produto (Jardim Vertical) para começar a comercializá-lo. Enquanto eu era paisagista, eu fazia no máximo 12 projetos por ano, o que eu já achava muito por sinal, até mesmo porque eram projetos mais voltados para as questões da arte. Na verdade, eu sou artista plástica também, por isso, eu olhava as coisas por este prisma e acompanhava de perto todas as obras. Quando eu lancei o os produtos da Quadro Vivo, eu fiz uma opção. Optei por abrir mão do mercado do paisagismo horizontal para fornecer para os meus colegas. Isso foi uma atitude bastante ousada, e eu acho que a minha postura no mercado permitiu que eu fizesse isso, pois eu sempre atuei com muita honra, ética, com um relacionamento de amizade com os colegas. Quando eu disse para o mercado que eu não iria mais elaborar jardins horizontais, passei a me permitir fazer no máximo 3 ao ano. Na realidade eu sempre procuro repassar aos meus colegas. Não acho justo “competir” com os meus principais colaboradores, que são os paisagistas.
- A partir de que momento você percebeu que o seu espírito empreendedor estava sendo colocado em prática?
Trabalhei durante 11 anos no mercado financeiro e ao longo desse período, eu acumulei um patrimônio. Na realidade, eu não abri a minha empresa por uma necessidade econômica, porque eu estava muito bem, com minha situação bem resolvida. Como eu sempre tive esse sonho de transformar o mundo, de deixá-lo mais verde. Não tinha a noção do quanto era desenvolver um produto. Tudo isso, exigiu grande investimento financeiro. Além disso, não dá para planejar o quanto eu iria investir em algo que nunca existiu. Uma coisa é você copiar e se inspirar em alguém para criar algo, outra coisa é você desenvolver algo do zero. Então você acaba indo através dos erros e acertos, a única forma que você tem para fazer isso.
Eu resolvi focar no desenvolvimento dos jardins verticais e com isso eu tive que me desfazer de grande parte do meu patrimônio, para poder investir na minha empresa. Acabei vendendo praticamente tudo o que eu tinha e acreditava – e acredito muito que tudo valeu a pena. Não me arrependo de ter arriscado, o banco me possibilitou uma grande expertise de olhar para o mercado e saber avaliar e ter um feeling com relação ao que pode acontecer. Como nada é garantido, foi uma aposta. O que nós não podemos esquecer é que economia e ecologia são ciências e por mais que o capitalismo tente de certa forma desconectá-las, elas são conectadas. Para esta poltrona que eu estou sentada viesse a existir, teve que tirar os materiais de uma única fonte, que é a mãe natureza.
O momento planetário e o momento da raça humana sobre este planeta é um período muito delicado. Temos que nos atentar para ver o que realmente tem valor. Não tenho nada contra o sistema capitalista e acredito que de todos os sistemas econômicos implantados no planeta, ele é ainda o menos pior, porque eu acredito que um sistema perfeito ainda não existiu e não sei se vai existir. Eu vejo que o sistema capitalista pode continuar a existir, pois existe o seu lado positivo, pois ele é um distribuidor de riquezas. O planeta gera riquezas para todos os seus filhos. Todos nós somos filhos de uma única mãe. Estamos ávidos pelo consumo, porém, não devemos nos esquecer que tudo vem da mãe natureza. A minha maior ambição enquanto empresária é que a minha empresa, que é a Quadro Vivo, seja uma referência internacional, de um modelo empresarial condizente com uma nova proposta, de uma nova era e que se ela não acontecer, nossa espécie estará fadada a extinção. Sempre busco passar para os meus colaboradores que o sucesso monetário, nada mais é do que o resultado de atitudes corretas. E o que é uma atitude correta? É você não fazer ao outro aquilo que você gostaria que não fosse feito com você.
- A Casa Cor foi um divisor de águas para o seu trabalho? Qual a sua opinião, enquanto empresária, sobre a participação da empresa em mostras, feiras e eventos?
Eu acredito que a Casa Cor não pode ser esquecida como o grande marco na história do mercado da arquitetura e da construção do Brasil. A maioria dos grandes nomes da arquitetura, decoração e paisagismo, tiveram uma conexão com a Casa Cor e os seus nomes em destaque no mercado nacional. Eu não posso negar que isso também aconteceu comigo. De uma forma geral, a Casa Cor rendeu muitos benefícios para o meu trabalho e para minha marca. Tudo é uma troca. A Casa Cor simplesmente abre uma porta e que você pode fechar, portanto, vai depender do seu profissionalismo, da sua criatividade, de você fazer um trabalho diferenciado, interessante e de bom gosto. Eu tive uma relação de muito sucesso com a Casa Cor. Em 2007, lançamos o nosso produto e o nosso conceito na Casa Cor, foi o maior sucesso. Também foi uma grande conquista quando fizemos a entrada principal do evento, que foi o primeiro projeto paisagístico a ser capa do Anuário da casa cor! Foi ali, que eu vi os meus esforços recompensados. Era um projeto gigantesco, bastante trabalhoso para fazer, monumental, com mais de 1000 m² e 10 metros de altura, em tempo recorde para fazer. Tive muita preocupação em não abalar a estrutura do Jockey, que é um patrimônio tombado. Contei com uma equipe maravilhosa, inclusive por parte da Casa Cor e dos parceiros. Acredito muito na matemática, pois ela é exata. Recebemos aquilo que a gente oferta. Tudo isso que aconteceu, foi resultado de muito trabalho, de muita vontade de fazer algo que enaltecesse a natureza e que fizesse os seres humanos olharem para essa maravilha. Eu tinha um propósito muito claro. A Casa Cor é um marco na arquitetura mundial. Se hoje temos uma Casa Black, junto com a Casa Cor, ok, temos espaço para todo mundo.
- Qual a sua opinião sobre a Casa Black?
Este ano, estou participando de ambos os eventos. Existem vários pontos de vista. Do ponto de vista profissional, do ponto de vista do empresário. Acredito que os fundadores da Casa Black tem um objetivo e os organizadores da Casa Cor devem ter outro. É importante entender o posicionamento diante do mercado. Eu vejo como coisas complementares de uma certa forma. A Casa Cor abre as portas para novos talentos. Um evento não é melhor do que o outro. Cada um tem o seu propósito. Como a Quadro Vivo se tornou uma referência não apenas nacional, mas também mundial no mercado de paisagismo vertical. Participamos de vários eventos importantes aqui do Brasil.
Este ano, por exemplo, estivemos presentes no espaço da Vogue, com o José Roberto Moreira do Vale, que é um profissional de um trabalho requintadíssimo, de muito bom gosto e é um profissional que está em voga. O resultado final ficou muito primoroso e o efeito estético conjugando com todo o ambiente. Nós temos a missão de entender o profissional, arquiteto, paisagista. Como é o seu projeto? Quais as cores a serem utilizadas? Textura, enfim. As plantas precisam se adaptar ao ambiente, do ponto de vista natural, mas acima de tudo, elas precisam se harmonizar com o ambiente. É um trabalho que vai além da técnica, além da metodologia, além do lado empresarial, tem o lado da sensibilidade, da beleza e da estética. Isso acaba sendo uma marca registrada de todos os nossos trabalhos. Como nos tornamos uma referência, por conta da qualidade, por conta da maneira do nosso trabalho, por conta da filosofia, nós acabamos participando de vários eventos.
- Fale sobre os benefícios oferecidos através do Jardim Vertical?
São vários. Estudos comprovam que os jardins tanto horizontais, quanto os verticais, agregam muito ao ambiente. O jardim vertical reduz a poluição visual, reduz na realidade, todos os tipos de poluição, começando pela mental. Não é prazeroso sentir o frescor de uma parede verde, cheia de vida e com plantas ao invés do concreto? A poluição sonora, abafando e não deixando a acústica da cidade repercutir, a poluição do ar, enfim. Eles funcionam como um “regulador térmico”, ajudando a reduzir a temperatura do ambiente, auxiliando no combate ao aquecimento global.
Quando revestimos uma casa com jardim vertical, por exemplo, no verão ela é uma muito mais fresca e no inverno muito mais quentinha, porque ele funciona como um termorregulador. Além disso, eles geram abrigo para a fauna, porque os pássaros, os insetos, enfim, terão onde viver. Nossa meta é revestir todas as cidades de plantas, transformando selvas de pedra em selvas de ver novamente, utilizando inclusive, os prédios. Essa mudança vai acontecer de forma natural. Tudo aquilo que é criado com o intuito de agregar a tecnologia à natureza é perfeito. Eu vejo que o jardim vertical não é mais uma tendência, ele é uma realidade e uma necessidade, que veio para ficar sem sombra de dúvida. Seja onde for, todo mundo tem que ter um jardim. A ONU (Organização das Nações Unidas) afirma que uma cidade, para ser salubre, precisa ter 12 m² de área verde por habitante. Só se nós fizermos isso subindo as paredes. E isso que eu estou fazendo!
- Qual o seu maior sonho?
Quero ver a natureza reintegrada a sociedade. Ver as grandes cidades se transformando em grandes florestas, ver o homem vivendo em total harmonia com o meio ambiente e respeito com a mãe Terra. Precisamos nos relacionar de forma saudável com a energia monetária. Ver a “prostituição” de valores banida definitivamente da Terra. Tenho amigos que me chamam de utópica e tenho amigos que me acompanham. É uma questão de sobrevivência, da nossa espécie. Ou é este caminho ou estamos fadados à extinção. Precisamos agir rapidamente!
Imagens: reportagem Paisagismo em Foco / divulgação